O Cavalo Puro Sangue Lusitano no Brasil
Os primeiros Cavalos Lusitanos foram introduzidos no Brasil pelos colonizadores portugueses por volta do ano 1541. Eram mestiços de Garranos e Pôneis galegos trazidos do norte de Portugal e dos Sorraias do sul. Depois disto, por um longo período nada mais se registrou sobre estes cavalos no Brasil.
A história começou a mudar, no entanto, a partir de 1808, com a chegada dos tradicionais cavalos selecionados na Real Coudelaria de Alter. Foram trazidos pelo Príncipe Regente D. João VI e pela Família Real, que se transferiram para o Brasil devido às invasões Napoleônicas na Península Ibérica. Em 1821, D. João VI presenteou Gabriel Francisco Junqueira, o Barão de Alfenas, com o garanhão Sublime, que passou a ser usado juntamente com outros reprodutores Lusitanos no cruzamento com éguas "crioulas", originando-se destes cruzamentos a base das raças Mangalarga e Campolina, selecionadas no sul de Minas Gerais, mais precisamente na região de Campanha.
Com a Independência e conseqüente separação do Brasil de Portugal, a criação do Puro Sangue Lusitano foi extinta, sendo substituída, a partir de então, pelas raças brasileiras oriundas do PSL.
Lusitano: o retorno
Meio século depois da chegada dos animais da Família Real, foram registradas outras tentativas de reintrodução do Puro Sangue Lusitano no Brasil. Contudo, sem sucesso.
Em 1953, por exemplo, Germano Domingos trouxe para o Brasil dois garanhões castanhos de toureio: Galitto e Bijou, criação de João Maldonado Cortez, de linhagem "Zapata", da Espanha. A proposta de Germano Domingos era fazer touradas portuguesas a cavalo com seu filho, o toureiro Orlando Figueira Domingos. Não conseguindo atingir seu objetivo, vendeu os cavalos e retornou a Portugal. O Galitto permaneceu na Sociedade Hípica Brasileira (SHB), no Rio de Janeiro (RJ), enquanto Bijou foi vendido para criadores de Minas Gerais, onde morreu. Seu esqueleto encontra-se na Escola de Veterinária da Universidade Federal de Minas Gerais. O toureiro Orlando F. Domingos, por sua vez, fixou-se definitivamente no Brasil a partir de 1963, transformando-se em um conceituado professor de equitação e cavaleiro de provas de Adestramento, tendo obtido para o País a medalha de Bronze nos Jogos Pan-Americanos de Caracas, em 1983. Atualmente, ele é conhecido como mestre Orlando Facada.
Outro registro de Lusitanos no Brasil é da década de 60, quando João Alfredo de Castilho importou o garanhão Xiquito. Oriundo da Coudelaria Nacional de Portugal, Xiquito, de pelagem negra, chegou para melhorar o plantel de Campolina que o criador selecionava em Barbacena (MG).
Em 1966, objetivando selecionar no Brasil animais puros, o empresário português Arnaldo Carreira Justo importou o primeiro lote de reprodutores Lusitanos. A bordo do navio "Brasil Star", desembarcaram no Rio de Janeiro, no mês de dezembro, os garanhões Zoonito ― tordilho da Coudelaria Nacional de Portugal ―, Dragão ― tordilho de Guilherme Giao ―, Completo ― de pelagem isabel, criação de Artur Telles Barrados Carvalho ―, e as éguas Zazá e Zaragata ― de Alda de Carvalho Vidal.
Com esses animais, iniciou-se em Teresópolis (RJ) a primeira criação de Lusitanos puros no Brasil. Além da seleção de produtos puros, eles também foram usados no cruzamento com éguas Campolinas e Bretãs. Era, no entanto, uma criação muito particular e fechada, sem interesse na divulgação da raça. Nos início dos anos 1970, a tropa selecionada por Arnaldo Carreira Justo foi transferida para Luiz Fernando de Oliveira Freire, Regina Thereza Baptista Tavares e Enio Monte, os quais deram continuidade à criação.
Em 1972, Antonio de Toledo Mendes Pereira, o Toni Pereira, tradicional criador de Cavalos Árabes, na época, e um dos mais respeitados nomes da eqüinocultura nacional, importou da Coudelaria Nacional de Portugal o garanhão Broquel, tordilho, e quatro éguas, entre elas a castanha Dinâmica, que chegou com o potrinho castanho Orjavo ao pé. Eram animais selecionados pelo então diretor daquela entidade, José Monteiro. Daquele ano em diante, o Cavalo Lusitano começou a ser conhecido no Brasil. Em 1973, por exemplo, Toni Pereira conquistou seu primeiro título de Grande Campeão da raça quando levou Broquel para uma exposição em Goiânia (GO).
Em 1974, Enio Monte importou o garanhão Hafiz, preto, linhagem Veiga, da Coudelaria Ortigão Costa, e a égua Hortênsia, tordilha, de Duarte Oliveira, com a potra ao pé Rapioca, também selecionada por José Monteiro.
No dia 1º de dezembro de 1975, entusiastas da raça, capitaneados por Toni Pereira, fundaram a Associação Brasileira de Criadores do Cavalo Andaluz. Reconhecida pelo Ministério da Agricultura, a entidade instituiu o Stud Book brasileiro, mantendo o registro genealógico das raças Lusitana e Espanhola (conhecidos como Andaluz) e de seus cruzados. A primeira sede da ABCCAndaluz foi na Rua Bom Pastor, 2530, no bairro do Ipiranga, na capital paulista, onde a entidade funcionou até 1978, ocasião em que foi transferida para o Parque Fernando Costa, o Parque da Água Branca, sede da Associação até 2005. Neste ano, já com o nome de Associação Brasileira de Criadores do Cavalo Puro Sangue Lusitano (ABPSL), transferiu-se para sua sede própria no bairro da Santa Cecília, em São Paulo (SP).
Fizeram parte da primeira diretoria: o presidente Antonio de Toledo Mendes Pereira, o secretário Ênio Monte, o tesoureiro Asdrubal do Nascimento Queiroz, e o diretor técnico do Stud Book Eduardo Benedito Marchi.
A Revolução que mudou a história do Lusitano no Brasil
Curiosamente, foi num momento conturbado da história política de Portugal, a Revolução dos Cravos, que a trajetória do Puro Sangue Lusitano no Brasil mudaria completamente. Em 1975, no auge da Revolução, quando fazendas foram tomadas, houve o risco de se perder o excelente patrimônio genético selecionado em Portugal, com as melhores linhagens da Península Ibérica. Neste momento, José Monteiro ofereceu aos criadores brasileiros o que havia de melhor no plantel, a fim de que déssemos continuidade à seleção iniciada naquele país e que poderia ser completamente perdida.
Em 1976, na intenção de salvar a seleção genética milenar da tropa de Lusitanos, Toni Pereira, Enio Monte, Asdrúbal do Nascimento Queiroz, Abel Pinho Maia Sobrinho, João Alfredo de Castilho e José Pinho Maia importaram tudo o que cabia de cavalos num avião cargueiro fretado. Assim, chegou ao Brasil, pela empresa Entre Rios, os animais da Raça Lusitana da mais alta categoria, entre eles, os garanhões Iprés, Fenício, Hiparco ― da Coudelaria Nacional ―; Herói ― de ferro Ortigão Costa ―; as éguas Havana, Ira, Navarra e Garbosa ― da Coudelaria Ervideira ―; Kalifa e Marinheira ― da Coudelaria Infante da Câmara ―; Java, Malagueta, Opala, Joaninha e Heroína ― da Coudelaria Duarte Oliveira ―; e Iaia, Marqueza, Rejusta, Rajada e Hipoteca ― da Coudelaria Nacional.
Em 1991, o Brasil celebrou um Protocolo de Reciprocidade com a Associação Portuguesa dos Criadores do Puro Sangue Lusitano (APSL), possibilitando que todos os cavalos da raça registrados no Brasil também sejam registrados no Stud Book português e em todos os países que possuem convênio análogo com Portugal. O intercâmbio possibilitou, ainda, a mudança de nome da entidade para Associação Brasileira de Criadores do Cavalo Puro Sangue Lusitano (ABPSL).
Cenário atual
Nas últimas décadas a criação brasileira investiu em genética, obtendo a mais seleta tropa de cavalos Lusitanos do mundo, tanto em morfologia quanto em animais funcionais, sejam eles para esporte, lazer ou lida. Reconhecido mundialmente, o Brasil já é o maior exportador de Lusitanos para a América do Norte e vem crescendo as exportações também para a Europa, inclusive para Portugal.
Com 350 criadores e um plantel atual de aproximadamente 12 mil animais ― onde a maior concentração ainda está no estado de São Paulo ―, o Lusitano vem registrando expansão para outras regiões do País, fazendo-se notório nas competições hípicas, especialmente no Adestramento e na Equitação de Trabalho onde, aliás, é o atual Campeão Mundial da modalidade.
Fontes de Consulta:
Artigo de Ênio Monte sobre o Lusitano no Brasil
Livro: Puro Sangue Lusitano - 25 Anos de ABPSL Livro: O Cavalo Lusitano, autor: Paulo Gavião Gonzaga